• 22 de Abril, 2025

Ary apela a reabertura dos palcos

 Ary apela a reabertura dos palcos

A cantora Ary defendeu a necessidade de o Governo “abrir as portas” para os músicos angolanos voltarem ao trabalho, após mais de um ano a viverem sob rédea curta face às medidas restritivas impostas para conter a progressão da pandemia da Covid-19.

Em entrevista à Angop, a artista diz ter chegado o momento de o governo deixar os artistas trabalharem, mas seguindo sempre as devidas medidas de biossegurança.

Durante a conversa, conduzida pelo jornalista Venceslau Mateus, Ary, uma das cantoras mais extrovertidas no mercado angolano e vencedora de vários prémios nacionais e internacionais, aborda o estado da música em Angola, fala das suas conquistas e dos novos desafios da carreira.

Angop – Ary, face ao actual momento imposto pela pandemia da Covid-19, que alternativas tem encontrado para continuar a fazer da música uma fonte de “ganha pão”?

Ary: As alternativas são as Lives e actuações em restaurantes. A situação está difícil para todo mundo, mas com a implementação do novo decreto não tenho feito nada.

Angop – Sente que o grosso dos artistas tem tido a mesma sorte? Como olha para todo este momento, com milhares de fazedores de arte praticamente na penúria, por falta de shows?

Ary: Infelizmente, nem todos tiveram essa sorte e sinto muito por isso. Por ser uma fase de extrema dificuldade para os artistas, o que mais entristece é ver os partidos a realizarem actividades políticas sem respeitarem as medidas de biossegurança e os artistas não puderem fazer nada, nem mesmo seguindo as devidas medidas de biossegurança.

Angop – O Governo liberou, este mês, a realização de espectáculos em salas fechadas, mas com regras a que os agentes do espectáculo não estão habituados. Para si, qual será o impacto desta medida?

Ary: O Governo deve deixar os artistas trabalharem, até porque nos primeiros decretos, os músicos foram os que mais trabalharam em prol do entretenimento do povo e na angariação de donativos para os centros de acolhimento de pessoas vulneráveis. Logo, o justo é abrirem as portas para os fazedores de cultura trabalharem, mas seguindo sempre as devidas medidas de biossegurança.

Angop – Para fechar este bloco, uma palavra de conforto àqueles artistas que sentem mais na pele o impacto da Covid-19, por não terem qualquer oportunidade de actuação?

Ary: A todos os fazedores da arte desejo muita sorte, peço paciência e muita fé. Tudo isso vai passar.

Angop – Mudando de ângulo, a Ary é uma das cantoras angolanas que mais rompeu barreiras e se afirmou no mercado. Qual foi o segredo?

Ary: Deus, a minha família, que é o meu pilar, e a minha equipa. Estar rodeada de pessoas certas ajuda muito nesse processo. O trabalho árduo e disciplina. São os segredos para ter conseguido derrubar todas as barreiras.

Angop –  Quando olha para 2002, marcado pela aparição no concurso  “Chuva das Estrelas” e vê o caminho que percorreu, passou-lhe pela cabeça, na altura, que chegaria onde chegou?

Ary: Nunca me passou pela cabeça que chegaria onde cheguei. Mas sabia que daria certo, só não sabia que a bênção seria assim tão grande.

Angop – A sua carreira, embora não pareça, não foi muito fácil no começo, porque o seu jeito extrovertido levou muita gente a fazer leituras erróneas sobre a sua personalidade. Como coabitou com isto, principalmente depois de cantar a música “Meu Patrão”?

Ary: No princípio as críticas fizeram muita confusão. Eram muitas, por causa da minha maneira extrovertida de ser, mas, felizmente, as pessoas foram vencidas pelo cansaço (risos) ficaram cansadas de criticar, porque deram conta que por mais fama que tenha não consigo mudar. As pessoas foram obrigadas a me aceitar como sou, e hoje não querem outra coisa.

Angop – Foi difícil romper os estereótipos da época e mostrar que a Ary só estava a fazer arte e, por trás daquela artista, havia uma cidadã, uma mulher, uma angolana de bem…?

Ary: Foi difícil sim, porque o angolano tem o péssimo hábito de querer moldar as pessoas à sua maneira, mas como não sou moldável (risos) consegui manter-me firme até hoje. As pessoas não têm que aceitar, apenas respeitar o ser de cada um.

Angop – É tratada carinhosamente como “Diva do Povo”. Porque acha que se lhe deu este título?

Ary: Acho que foi atribuído porque a maior parte das pessoas se identificaram comigo e a maioria é o povo. E a voz do povo é a voz de Deus.

Angop – O que isso significa para si?

Ary: Significa o reconhecimento de um trabalho muito bem feito e pelo facto de tocar o coração das pessoas.

Angop – Porquê a escolha da música e não outra arte ou profissão?

Ary: Por que nasci para isso. A música corre nas veias e não existe nada melhor do que trabalhar por amor e com amor.

Angop – Como tem sido a promoção do produto Ary no mercado internacional, já que grande parte dos nossos músicos busca outros mercados?

Ary: Temos trabalhado devagar e bem. E na calada. Pode não ser hoje nem amanhã, mas um dia (risos) vou conseguir conquistar o coração do Mundo inteiro.

Angop – Onde vai buscar a inspiração para o trabalho que apresenta ao público?

Ary: Busco inspiração em Deus.

Angop – O ano 2007 marca a sua carreira musical com o lançamento do CD “Sem Substituições”, cujos cartões-de-visita são as músicas “Como Te Sentes Tu?” e “Meu Grande Amor”. Por dez anos foi finalista do Top dos Mais Queridos, que duas vezes conquistou (2014 e 2016). O que significam estes dois troféus?

Ary: Estes dois troféus são o resultado de um trabalho árduo, dedicação, paciência e disciplina que tive ao longo dos anos.

Angop – Até que ponto a conquista destes prémios influenciou a Ary na forma de ser e estar?

Ary: A conquista dos prémios fez-me querer trabalhar mais e melhor em prol da música angolana.

Angop – Que projectos tem preparados a curto e médio prazos?

Ary: Tenho preparado o novo álbum. Só estamos a ver a melhor data para o lançamento.

Angop – Que avaliação faz da música angolana da actualidade?

Ary: A música angolana já esteve no seu melhor. Hoje está um pouco descartável, mas a vida é assim mesmo, são gerações diferentes.

Angop – Há quem diga que a música é uma das vias do processo sócio-educativo e vocês, como ícones, têm uma legião de seguidores que fazem ou imitam tudo. Até que ponto estão os músicos angolanos preparados para ajudar na edificação de uma sociedade sã?

Ary: A base da edificação de uma sociedade sã está na educação familiar. Acredito que o berço define muito este processo. Os músicos vêm apenas auxiliar nessa caminhada, levando a alegria em forma de música.

Angop – Acredita que os músicos têm sido bons exemplos para a construção de uma sociedade moralmente saudável? É que há muitos escândalos na classe e vários artistas cujas práticas deixam algumas dúvidas…

Ary: Acho que em qualquer profissão existem os bons, os médios e os maus. Os artistas são seres humanos e propensos a erros. A sociedade é que deve saber filtrar o que é errado e o que é certo, aí o reforço da questão da educação.

Angop – Em termos musicais, há vozes que dizem que a nova geração nada traz de novo na música angolana, pois aposta mais na produção de música “descartável”, ou seja, comercial. O que diz a respeito destas afirmações?

Ary: Esta é a nova geração (risos). Não temos como mudar a tendência.

Angop – Tem procurado ouvir ou contactar artistas da “velha geração”, quando está a preparar um novo tema musical, principalmente quando se trata de música tradicional?

Ary: Sempre. Sou o que sou hoje porque bebi e bebo, até hoje, muito da nossa ancestralidade. Há um ditado que diz que na boca de um mais velho podem faltar dentes, mas não faltam bons conselhos.

Angop – Acha que o testemunho está a ser bem passado?

Ary: Sim. O resto deixo ao critério dos fãs.

Angop – Fruto do que se faz e do que se apresenta, actualmente, no mercado angolano, acha que temos ou estamos à altura de competir com outros mercados, principalmente africanos?

Ary: Sim. Estamos à altura e não é à toa que ganhei o prémio de melhor artista da lusofonia em 2015. Temos exemplos de outros artistas angolanos que ganharam e isso faz-nos ter a certeza de que estamos a fazer um bom trabalho e podemos sim competir com outros mercados.

Angop – Como cantora já se sente realizada?

Ary: Sim. Como cantora angolana já me sinto realizada, mas é como tudo. O ser humano é insaciável por natureza e por este motivo quero e almejo alcançar outros patamares fora de Angola.

Angop – Que futuro antevê para Angola, face as dificuldades impostas pelas crises económicas e financeiras e pandémica da Covid-19?

Ary: É algo difícil de se responder, pois está tudo instável. Mas como toda fase má passa, vamos aguardar e ter paciência por dias melhores. Como diz o ditado popular, depois da tempestade vem a bonança. Virão boas coisas.

Angop – Em Angola já se vive da música?

Ary: Já sim. Desde que me conheço como cantora. Não somos ricos, mas dá para levar uma vida estável, se o artista souber gerir o que ganha.

Angop – Onde fica a família?

Ary: A família está sempre ao meu lado. É o meu suporte, o meu pilar.

Angop – O que lhe dá mais trabalho, preparar um álbum ou cuidar da casa?

Ary: Mais difícil é cuidar da casa…

 

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