Rafael Marques diz que o novo Governo de João Lourenço é um “insulto” à inteligência dos angolanos. O jornalista considera que as poucas mexidas no Executivo, depois de o MPLA sofrer perdas pesadas nas eleições gerais, só demonstram que o Presidente da República.
“Por mais justificações que o Presidente possa dar, é um Governo francamente péssimo. E é fundamental que se quiser ter um mandato em que possa merecer algum respeito, alguma atenção e diferencia dos cidadãos, precisa recolher-se, refletir e socorrer-se, ancorar-se na sabedoria, em bons conselhos”, sugere.
O jornalista acrescenta que “os níveis de intolerância dos cidadãos angolanos” que criticam o Presidente da República” são culpa do próprio MPLA, partido no poder há 47 anos, e à “forma repressiva como sempre lidou com estas questões”.
O mais importante para Rafael Marques não é se, neste novo mandato de João Lourenço, se multiplicarão os protestos nas ruas, à semelhança do que promoveu recentemente a oposição.
“Se nós temos a certeza que este Governo de repetentes é muito mau, sobretudo a equipa económica, então devemos nos organizar com ideias, com instrumentos críticos de pressão, para que tenhamos uma outra equipa económica, para que tenhamos governantes que apostem no saber e não na incompetência como forma de encapotar a nova captura do Estado em Angola. E isso não vai ocorrer com protestos nas ruas. Precisamos usar a cabeça”, afirma.
Fome e desemprego são as prioridades
Com o novo mandato ainda a começar, Marques avisa que, para já, não é tempo de se pensar nas eleições autárquicas – nas quais a oposição espera poder sancionar o partido no poder. Para o jornalista fundador do site “Maka Angola”, o que os “cidadãos têm de fazer, se [querem] um país diferente, é mobilizar as suas forças críticas”.
“Se estamos a acusar o Presidente de ter desrespeitado a inteligência dos cidadãos com a nomeação deste Governo, não vamos nós, enquanto cidadãos, apostar na burrice para combater a falta de inteligência do Executivo. Este Governo é francamente mau, mas a sociedade civil e a oposição não podem ser piores”, diz o activista.
Na opinião de Marques, para já a prioridade é pensar nas questões que dificultam cada vez mais a vida dos angolanos, como a fome e o desemprego. “Não serão as autarquias que gerarão empregos, mais saúde, mais educação. É só olhar para a própria Constituição e perceber que as autarquias serão apenas a nível municipal; não serão sequer a nível provincial nem comunal”, explica.
Rafael Marques diz, por outro lado, a propósito dos protestos e perseguições de ativistas, que “não faz sentido estar a prender pessoas”. Mas afirma que se “a única aposta que há da parte da sociedade é fazer protestos nas ruas para mudar a situação, nada vai mudar.”
Sublinha ainda que “o nível de intolerância será cada vez maior e, com isso, [poderemos não encontrar] capacidade para discutir os temas de educação, de saúde, de emprego, da fome, que precisam ser colocados na mesa para que as pessoas compreendam e exponham aqueles governantes que não estão a fazer absolutamente nada. Que há décadas passam a mudar de cargos ou a manterem-se nos mesmos cargos para prejudicarem cada vez mais Angola e os angolanos. Estes dirigentes têm de ir para a rua, ponto final.”
João Lourenço “é teimoso”
O director do site “Maka Angola” sustenta, entretanto, que, findo o “eduardismo”, o Presidente João Lourenço “está muito mal aconselhado” e “é teimoso”. Acrescenta que a arrogância política que carateriza a sua governação não pode, neste mandato, colocar os cidadãos angolanos numa situação pior.
Rafael Marques pede aos angolanos para não permitirem isso. “Porque temos capacidade e inteligência para dizer: não é este o caminho”, sublinha.
Marques sempre denunciou a corrupção em Angola. Lamenta, por conseguinte, que, com as recentes nomeações de ministros e governadores, o Presidente João Lourenço tenha provado que o país voltou ao período da impunidade.
Ministros e governadores “recompensados”
“Os governadores que perdem, os ministros que fazem asneiras, são recompensados com a redução nos cargos ou são promovidos para outros cargos. A ex-governadora de Luanda, que perde Luanda por uma margem de 30″, é promovida a ministra do Ambiente”, exemplifica.
“Vai fazer o quê no ambiente? Vai queimar o que resta do desastre climatérico que Angola está a viver. E isto é responsabilidade exclusiva do Presidente. Agora, é necessário que alguém explique ao Presidente que pode acabar numa situação pior do que o seu antecessor se persistir numa política de antagonismo contra toda a sociedade”, defende.
Rafael Marques falou à DW, no final de uma conversa na Fundação Calouste Gulbenkian, onde três convidados partilharam as suas visões sobre o papel do jornalismo na atualidade e no desenvolvimento.