Luther Campos: “Saí da minha casa directamente para uma cela solitária”
Activista Luther Campos (A fonte)
A fonte, traz para esta edição mais uma entrevista com o activista civíco Luther Campos. O defensor dos direitos humanos fala sobre sua prisão, sua relação com a UNITA, condenação dos quatro “presos políticos” e das liberdades de reunião, manifestação, expressão e imprensa. Acompanhe…
A fonte (A) – Esteve detido durante muito tempo e sem julgamento. Como foi? Qual é o episódio que nunca te sairá da memória?
Luther Campos (LC): Muito obrigado pela consideração em me intrevistar! Foi muito duro e incompreensível o tempo todo porque eu já esperava tudo mas depois começou a ser difícil e incompreensível o que estavam a me fazer. É triste quando você é tratado com diferença dentre os outros seres humanos numa questão de complexo. Eu saí da minha casa directamente para uma cela solitária e disciplinar, quando naquelas celas são apenas para pessoas altamente perigosas e os presos que complicam a vivência no interior Penal. No meu caso, foi diferente, infelizmente… O Episódio que mais me marcou é o tempo que fiquei na cela solitária que contribuiu na dificuldade de enxergar, e a situação piora a cada dia.
“As supostas acusações pareciam um filme pornográfico, onde o actor principal tem problema de ereção”
Luther Campos no banco dos réus. (DR)
A fonte – Depois, foi finalmente julgado. O que sentiu no momento do julgamento?
LC: No momento do Julgamento senti nojo do nosso sistema judicial, visto que não tinha cabimento as supostas acusações pareciam um filme pornográfico, onde o actor principal tem problema de ereção. Chegou um momento em que os homens todos ligados ao Serviço de Investigação Criminal (SIC), contratados para deporem contra mim no tribunal, não estavam a perceber o trabalho que foi combinado.
A fonte – As acusações de que estava a ser alvo tinham razão de ser?
LC: Até um certo ponto não me admira porque conheço perfeitamente o MPLA, que considero partido satânico. As mesmas acusações não me surpreenderam, visto que fui e sou considerado um cabo eleitoral e a pedra no sapado do MPLA. Então, nem que me acusassem que matei Agostinho Neto não ficaria surpreso. Para um partido que carrega todos os males, digo que tinha que ser assim para eles conseguir o que sempre almejaram.
A fonte – Durante a tua estadia na cadeia dizia-se que a UNITA tinha te abandonado. Até que ponto estes relatos correspondiam a verdade?
LC: A UNITA como partido fez a sua parte, mas não conseguiu agradar a maioria das pessoas. É mentira que a UNITA me abandonou, mas uma vez repito em dizer, infelizmente a UNITA não conseguiu satisfazer muitos dos meus seguidores, familiares e até mesmo os activistas, mas o partido fez a sua Parte. Entendo a matéria e tinha coisas com maior prioridade como o controlo cerrado das eleições e o pessoal sabia a falta que faria nas eleições. Então, muitos não queriam perceber o posicionamento da UNITA sobre a minha detenção. A UNITA não me abandonou. Por isso continuo firme e forte no partido.
A fonte: Continua a fazer activismo cívico e político?
LC: Continuo, sim ,a fazer as mesmas atitudes até porque já nadei muito para morrer na beira. Se eu parar ainda sinto que haverá muito retrocesso na nossa luta que é libertar Angola.
Luther Campos e dirigente da UNITA, Adriano Sapiñala,
A fonte – Há quatro activistas condenados por ultraje ao presidente, um deles, “Tanaece Neutro” já esteve contigo na Cadeia. Como olha para este caso?
LC: Infelizmente é uma situação de lamentar até porque “Tanaece Neutro” esteve sempre firme na luta. Assumo com todas as letras que “Tanaece Neutro” não é um homem vendido mas, sim, muito emotivo. Meu amigo e irmão deixou-se levar por muitos elogios de pessoas que nem estão aqui, não vou citar nomes para não dar fama a muitos supostos ativistas que depois Tanaece Neutro não teve controlo e começou a disparar contra tudo e todos. Reitero-vos que no activismo ninguém anda sozinho. Mas há muita injustiça no processo dos quatro activistas.
Mas nós não vamos parar de lutar…
Afonte – Qual deve ser o estado psicológico de “Tanaece” que, em menos de um ano da sua libertação voltou a cadeia e está numa cela solitária e deixando a sua esposa em estado de gestão?
LC: O estado psicológico do “Tanaece Neutro” deve ser aquele que ele sempre assumiu que pelo povo pode morrer. Assim ele torna-se mais forte. Infelizmente não fui a cadeia para os visitar porque tenho a plena certeza de que não vou entrar até porque tenho falado com alguns reclusos e muitos efetivos dos serviços prisionais. “Tanaece Neutro” está muito abalado e tem um sentimento de traição por parte de muitos outros que assim partilhou o seu projecto de mudança de liderança do presidente, João Lourenço e também carrega o sentimento de arrependimento porque é visível que as solidariedades reduziram consideravelmente se comparado com a detenção passada. É visto que as redes viraram contra o nosso irmão que até muitos disseram bem feito fizeram bem de lhe prender outros dizem tem que apodrecer na cadeia e isso faz-me chorar. Infelizmente, o meu amigo não está bem psicologicamente. A pior coisa na vida é te tirarem a sua liberdade. Imagine que em menos de cinco meses de restituição de liberdade voltas com uma condenação sumária? Deixando assim a mulher grávida. Ele ama muito a sua esposa e os seus filhos. “Tanaece” é único filho de sua Mãe, então a Teresa é tudo e mais alguma coisa para ficar sozinha em pouco tempo. Não acredito que Ele esteja bem psicologicamente.
“O MPLA está num beco sem saída e em curva apertada”
Activista Tanace Neutro foi condenado a dois anos de prisão, meses depois da sua soltura, (A fonte)
A fonte – Acha que há tortura psicológica nas cadeias angolanas?
LC: A muita tortura psicológica a esse momento o “Tanaice Neutro” está em uma tortura psicológica… Viram o último episódio que aconteceu com a cantora Jéssica Pitbul que foi detida por desacato às autoridades? Nem se quer fez quatro horas horas detida. Mas o “Tanaece” e os outros foram condenados pelo mesmo crime a dois anos e seis meses de prisão. Isso é inacreditável. É pura tortura psicológica. Eu próprio fui alvo desde o princípio da minha cadeia até ao fim sempre estive submetido a tortura psicológica.
A fonte: O pai de “Gildo das Ruas”,disse que o “Estado deve deixar de criar heróis“. Quer comentar?
LC: Isso é a pura verdade. O MPLA está num beco sem saída e em curva apertada onde se ele acelerar vai capotar e se reduzir o povo vai ultrapassar.
A fonte: Como olha para liberdade de reunião, manifestação, expressão e de imprensa nos dias hoje?
LC: Infelizmente aqui em Angola não temos liberdades. Estamos a ver os órgãos de soberania a violarem sem camisinha a constituição. Ainda estamos longe para falar de liberdade.